Trecho sobre o despertar o Espírito após o suicídio
“…
Foi, portanto, derramando aflitivo pranto que, em dado momento, naquele primeiro dia, sob as desveladas atenções de Carlos e Rosendo, bradei excitado, febril, incapaz de por mais tempo me conter:
“— Mas, afinal, onde me encontro eu?… Que aconteceu?… Estarei sonhando?… Eu morri ou não morri?… Estarei vivo?… Estarei morto?. .
Atendeu-me o cirurgião hindu, sem se deter na medrosa atuação. Fitando-me com brandura, talvez para demonstrar que minha situação lhe causava lástima ou compaixão, escolheu o tono mais persuasivo de expressão, e respondeu, sem deixar margem a segunda interpretação:
“— Não, meu amigo! Não morreste! Não morrerás jamais!… porque a morte não existe na Lei que rege o Universo! O que se passou foi, simplesmente, um lamentavel desastre com o teu corpo físico-terreno, aniquilado antes da ocasião oportuna por um ato mal orientado do teu raciocínio… A Vida, porém, não residia naquele teu corpo físico-terreno e sim neste que vês e contigo sentes no momento, o qual é o que realmente sofre, o que realmente vive e pensa e que traz a qualidade sublime de ser imortal, enquanto o outro, o de carne, que rejeitaste, aquele, apropriado somente para o uso durante a permanência nos proscênios da Terra, já desapareceu sob a sombria pedra de um túmulo, como vestimenta passageira que é deste outro que aqui está…
Acalma-te, porém… Melhor compreenderás à proporção que te fores restabelecendo…”
Trouxeram-me em maca rumo da enfermaria. Meu estado requeria repouso. Serviram-me reconfortante caldo, pois eu tinha fome. Deram-me a beber água cristalina e balsamizante, pois eu tinha sede. Em redor, o silêncio e a quietação, envolvidos em ondas de reconforto e beneficência, convidavam ao recolhimento. Obedecendo à caridosa sugestão de Rosendo, procurei adormecer, enquanto o desapontamento, trazido pela inapelável realidade, fazia ecoar suas decisivas expressões em minha mente atormentada:
“— A Vida não residia no corpo físico-terreno, que destruíste, mas sim neste que vês e sentes no momento, o qual traz a qualidade sublime de ser imortal!”
…”
Retirado do livro “Memórias de um suicida”, um romance psicografado pela médium espírita brasileira Yvonne do Amaral Pereira, cuja autoria é atribuída ao espírito do romancista português Camilo Castelo Branco